impotência da imaginação adulta

Por causa da nossa impotência em controlar o modo, a qualidade e a força com que nossa memória afetiva opera na gente, quase nunca nos colocamos diante das coisas como elas são ou poderiam ser, e, quase sempre, olhamos para as coisas em nossa volta, enquanto estamos sentindo tantas outras coisas que ainda não digerimos, ou que constituiram um lugar propagando-se em nosso inconsciente com funções de defesa e seleção, e, por isso, infestam, intoxicam e definem a nossa percepção presente das coisas. O problema é que este metabolismo confere de modo tirânico o sentido e a qualidade emocional da nossa existência, impedindo que possamos trocar e tocar o mundo com percepções novas, com percepções atuais livres das estruturas de julgamento do passado. Em outras palavras, vivemos num presente cheio de passado, e, construímos o futuro igualmente modelado pelo passado que nos definiu. As crianças, que ainda não acumularam bloqueios profundos, traumas sociais e afetivas e mecanismos de interdições que se auto-reproduzem paulatinamente no decurso da vida, possuem uma liberdade de tocar o mundo mais livre, com dispositivos de percepção que respondem ao presente e pelo presente se deixam ser tocados, de modo novo e inusitado. Não se trata unicamente de uma questão de que o preço da cultura é a repressão, mas cada indivíduo sofreu formas e eventos de inibição, coerção e constrangimento, isto é hostilidade, agressão psicológica, encenados por uma ciranda de situações na qual alternou no papel de vítima e culpado, ator e espectador, sofreu e atuou vigiando e punindo seus diversos afetos, pais, mães, irmãos, namoradas, amigos, estranhos, conhecidos, familiares, e colegas de trabalho. Toda essa tecitura e malha de mágoas está devidamente registrado nos bilhões de neurônios que comandam com cautela e propriedade seu comportamento afetivo.

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