Diário de Bordo de Jandineli



Demian. As aulas de palhaçaria tem sido para mim uma experiência magnífica. Apesar de eu estar levando uma vida monótona e sem grandes alegrias, essas aulas fazem um grande diferencial na minha vida e nos meus dias, então espero ansiosamente durante toda a semana as terças-feiras para assistir essas aulas maravilhosas.
Os alongamentos para mim é a parte que mais acho bonito de ver e difícil de fazer, é admirável como o professor faz e inventa tudo aquilo, vou confessar que acho super legal o modo que o professor aborda isso, porém acho que está num nível bem mais avançado do que o meu corpo pode oferecer, percebo também que a grande maioria dos alunos tem essa dificuldade, até os que tem um corpo favorável que permite se esforçar bastante para fazer o melhor. Por isso rio muito nessa parte, pois fico ridícula tentando fazer aquilo sem poder, acredito se eu me concentrasse mais também não conseguiria, pois até os magros tem dificuldade nesta hora da aula.
Trabalhar as minhas fraquezas de forma agradável foi o que mais gostei nestas aulas, é uma aula em que eu esqueço de tudo e quase tudo é permitido, até soltar meus gases, e isso é fantástico. Quando vou para a outra aula de teatro e solto meus gases todo mundo dá risada, mas que bom que é o único lugar no mundo em que posso soltar meus gases. Não consigo parar de falar o quanto esta aula é melhor que a outra de teatro que faço. Apesar de termos 3 pessoas da aula de palhaçaria na de teatro, a de palhaçaria é diferente, é genial e tem sempre um plus a mais, acho não, é a melhor matéria que já tive em toda a minha vida.
No começo não imaginava o que era palhaçaria, achava que devia ser chato, achava os palhaços sem graça, continuo odiando os quadros que tem palhaço. Tenho uma amiga que tinha no quarto e postou outro dia no face uma foto de palhaço e eu odiei, me remete algum medo que não sei, talvez uma Coulrofobia bem fraquinha. Como está na moda o termo "Clown" e um bocado de gente sem graça dizendo que é palhaço porque fez uma ou duas oficinas de palhaço, resolvi entrar neste curso. Desde o ano passado tentei entrar, porém não havia mais vagas para tal curso, então quando recebi no email a ementa deste curso fiquei apaixonada e tratei logo de me inscrever no lixão para ela.
Muitas pessoas ficam loucas quando digo que estou fazendo esta matéria, acho que todos de qualquer matéria deveriam pegar esta matéria um dia, pois ela é muito esclarecedora do nosso papel na arte e na sociedade, pois para mim, o palhaço remete a todos os desejos, alegrias, tristezas e medos intrínsecos do ser humano que se externaliza através de gestos, movimentos, olhares e sutilezas inerentes ao ser humano, que é reconhecida facilmente diante dos olhos de qualquer ser demasiadamente humano, onde é possível se identificar, amar ou odiar aquele ser que nos reflete.
Nossa sala tem uma turma especial, parece que todos foram escolhidos pelo dedo de Deus, pois tem gente que já é palhaço sem ter nunca estudado, gente que se esforça e não consegue ser engraçada, gente que não precisa de nada, pois só de se olhar já é engraçado, gente que é super fechado na sociedade, tem cara de nerd e ainda me arranca os melhores risos, gente que nem precisa de maquiagem nem de peruca pra ser engraçada, gente que tem técnica de ser engraçado e tentando ser mais que engraçado fica sem graça, gente que é tão sem graça tentando ser engraçado que acaba sendo engraçada, gente sem graça que não quer fazer graça e é engraçado, e gente que se acha que é engraçado e vê que não tem graça nenhuma, como eu de palhaça tentando ser engraçada vendo que não sou.
Mostrar meus maiores defeitos, minhas maiores frustrações, meus traumas, enfim, extravasar, foi a parte mais louca, ruim, boa e gostosa de todas, é isso mesmo, todos esses sentimentos dissonantes veem a tona, pois vivo numa sociedade que me pune por eu ser gorda, por minha barriga ter caído, por eu ter um peito grande, por eu estar com papada, por eu ser gorda e estar predestinada a não poder ser feliz com um namorado e ter um bom emprego, pois a sociedade discrimina mesmo sem dó nem piedade, e ainda recrimina se eu peidar, fazer as porcarias que todo mundo já fez um dia e irão jurar que nunca fizeram, dentre traços psicológicos, corporais e da personalidade de cada palhaço bufão e feião dentre outros que estão internalizados, exteriorizados, ou estereotipados  nas nossas mentes e entranhas.
Poder ser livre para fazer o "quase tudo" o que se quer é muito interessante, brincar com nossos defeitos, mais ainda, pois se rirem é porque acharam agente ridículo, e se não riram, de nada valeu nosso esforço para nos transformarmos na criatura mais estranha da face da terra. Por isso a reação do público, seja boa, ou seja má, é a resposta direta ao palhaço, pois ele interage diretamente com seu público, de máscara, porém sem máscara, de figurino, porém sem figurino, atrás de uma personagem, mas sem personagem, pois por trás de tudo aquilo existe uma pessoa que colocou toda roupa, acessórios e maquiagem para ser nada mais além que ela mesma, pois para nos mostrarmos como somos para a sociedade, temos que nos esconder atrás de algo, e nada melhor que um palhaço para tal feito.
O mundo mágico dos palhaços faz-nos brincar com o risível, que vem do ridículo, pois quando nós, seres humano olhamos alguém mais estranho, mais feio, mais terrível que nós tendemos a rir. O palhaço é alguém que se diminui para que o outro cresça, é a humildade, é se expor, mostrar seus defeitos, sua feiura, sua fraqueza , é ser humano.



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