Como vejo Rosário – uma fábula de mulheres, Deusas e animais
Rosário mostra a beleza do poder feminino de transformar o sofrimento e a dor em amor e soberania. Vejo em Rosário, o ritual de uma mulher e ao mesmo tempo várias mulheres, conquistando a sua soberania diante das adversidades do mundo em que habita. Adversidades como a violência masculina contra a mulher, a pobreza, o preconceito de cor, a solidão, a desterritorialização e diversas condições de opressão. Para as platéias brasileiras essas imagens construídas no espetáculo nos remetem à história da escravidão no Brasil, mas essas condições de opressão ainda são vividas por mulheres hoje em diversos lugares do Brasil e no mundo e as marcas dessas feridas históricas se mantêm na memória de uma população ainda maior. A fábula em forma de ritual Rosário expõe marcas e nos deixa diante de feridas que nem todos e nem sempre temos coragem de olhar. Mas Rosário seduz e desperta a nossa atenção para essas dores de modo suave e delicado, com a sincera sabedoria de quem carrega também todos os remédios e os poderes femininos necessários para curar as feridas que exibe. O sentimento do sagrado, a conexão com a nossa ancestralidade, a beleza feminina, a especial ligação da mulher às forças da natureza, a dança e o canto, a voz e o corpo. São tudo que é necessário. Todos esses remédios se encontram em Rosário. Todos esses poderes se encontram em cada mulher. Quando nos falta coragem de olhar para as nossas feridas porque doem e incomodam, elas entram em processo de infecção alastrando seu poder destrutivo. Se não encontrarmos tempo para dar atenção às marcas de nossas feridas, elas permanecem confortavelmente ecoando em nossas mentes e nossos corações sem que possamos nos libertar de sua influência. Vejo neste espetáculo o ritual de um Rosário de mulheres reunindo motivação, esforço, coragem e sabedoria para expulsar de suas memórias os venenos do sofrimento de modo a renascer, reinventar e redescobrir a si mesmas.
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